sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Dois ou três almoços, uns silêncios.


Há alguns dias, Deus — ou isso que chamamos assim, tão descuidadamente, de Deus —, enviou-me certo presente ambíguo: uma possibilidade de amor. Ou disso que chamamos, também com descuido e alguma pressa, de amor. E você sabe a que me refiro. Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de "minha vida". Outros fragmentos, daquela "outra vida". De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos. Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas. Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração. Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector "Tentação" na cabeça estonteada de encanto: "Mas ambos estavam comprometidos. Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível". Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece. De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou — descuidado, também — em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia. Era isso — aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria. Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Elas lutavam por ideais, por direitos a mais, por maior justiça, por democracia em seu mais bem feito estado de receber por tudo o que tinham em mente, e assim funcionava. Sua persistência era muito maior do que a própria força que seu nome diz. Mulher, que antes era tão bem ornamentada e descrita. Mas o tempo transformou as cabeças femininas, que não estão mais brigando e pedindo por seus direitos, elas não sentem mais a vontade de querer algo a mais. Elas apenas fazem o que mandam. Sim, os tempos mudaram, assim como a garra feminina não é mais a mesma que se encontrava na batalha pelo dia internacional da mulher e outros trancos e barrancos que elas enfrentaram, para nos fornecer maior participação na sociedade. Antes donas-de-casa, que guerrilhavam para a paz familiar e um bom trato no marido, diga-se de passagem, esse escravismo da antiga mulher, pode existir, mas não tão significativo como antes. Ainda bem que algumas tiveram a honra e coragem de querer mudar o antigo regime, quase militarista sobre tais. Com todas as diversificações de pensamentos e novas mulheres, ainda existem alguns exemplos de Ana Terra (símbolo da mulher rio - grandense), Joana D’arc, ou qualquer uma dessas que fizeram seus nomes história. E são dessas mulheres que esperamos uma nova volta, uma maior concentração de ida para frente. As palavras são fáceis e aceitáveis, mas as ações demoram a se concretizar e ocupam maior espaço para seguir em frente. Esperamos e somente isso que fazemos sempre, não tem voz muito menos o respeito, e devemos brigar por essa entrada na vida, ou então acabar sempre na mesmice dessa vida monótona e incapaz de satisfazer os desejos.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

O bom brasileiro

E o homem não vive como vivia nas velhas muretas de Roma, lá era muito mais tranqüilo do que um bom desenvolvimento aqui. Os homens cortejavam as mulheres, que na sua vez eram muito mais interessantes das que hoje brigam pela sua existência. Tinham uma verdadeira democracia, e não uma disputa por tudo o que fazem hoje. As praças e templos eram lugares de bom convívio, a música era de suma qualidade, os poetas e músicos não tinham problemas com o que fazer nem se o seu salário era de acordo ou não e muito menos taxados de loucos desvairados, e a dança era em uma simetria condizente a estrutura corpórea do sexo. E hoje? O que vemos hoje? Total desfiguração de uma sociedade que prima pela vida corrida, onde a música não lhe faz muito sentindo, e nos que fazem, nem serve para muito. Onde a política continua sempre a mesma chantagem e compra cada vez maior. A sem-vergonhice vista nos rostos de cada um que colocamos no poder, é concluída no estrago e roubo maior, nunca visto por olhos dos trabalhadores. Sem a justiça pela qual fazem jus. E a depravação não acaba somente nas linhas da política e bela sociedade existente no Brasil, o que dizer sobre a atual cultura, onde o bom cidadão brasileiro adota a cada passar de tempo? A cultura é o depravar de uma sociedade, e nem mesmo o Brasil tem um certo nome, onde cultiva suas raízes como sempre disse o presidente. Não há musica onde a mulher não seja uma cachorra ou uma vadia, e todo o bom homem quer dizer-se macho, até que provem o contrário. E nota-se essa disseminação nas crianças, que dançam sem qualquer tipo de problema o ‘Créu’. E não há mais infância sem baixaria, não há mais a inocência nos olhos carentes de tempos de vento fraco e admirável. Há a falta de esperança e o caos que aumenta com o novo carro na rua, mais uma bala sem rumo e mais um olhar perdido para a destruição em massa. E pelo que você luta? A vida estressante do brasileiro que nunca desiste, que esta sempre esperando por algo a mais na sua vida? O brasileiro que tanto reclama de tudo, não faz nada para a modificação, nem se quer ajuda a escolher pessoas que realmente façam a diferença. E é nesse grande estilo de vida que o Brasil cai nas trevas e se afunda na fossa cada vez maior e suja. Gostamos de apanhar e sempre acabar no juízo final. E é assim que vivemos, nesse conflito raivoso entre não saber o que fazer e o agir incorretamente. E ainda temos o gosto e a petulância de dizer ‘Sou brasileiro e nunca desisto’.